Há alguns dias, por correspondência, um escritor amigo elogiou meu trabalho como editor. Nas palavras dele, eu tinha a “coragem e agressividade necessárias para o ofício”. Engraçado que eu nunca tinha parado para pensar nas habilidades necessárias para um bom editor ou, se pensei, foi algo mais no campo da precisão, do rigor estético etc. A figura do editor, com seus óculos e sua caneta nervosa em nada me lembram a figura de um guerreiro medieval com uma espada a cortar as gordurinhas dos textos de maneira implacável. Um editor então seria um personagem porteiro, para usar o jargão nerd de viciado em jogos.

De qualquer forma, o raciocínio faz sentido: não é fácil invadir o espaço de criação de alguém e, sem reservas, dizer o que pensa sobre uma obra, sugerindo, inclusive, mudanças. Em algumas ocasiões fui desaconselhado por amigos a sugerir mudanças. O argumento era de que a pessoa talvez se chateasse e não quisesse mais publicar, que seria buscar inimizade ou que não valeria a pena o desgaste. Mas como pensar o ofício do editor sem uma faca de bucaneiro entre os dentes? Hein?

Edição e agressividade

Na verdade realmente é preciso coragem e agressividade para ser editor, mas um pouco de tato nunca é demais. Toda criação artística séria deve ter mobilizado muita energia emocional de seus criadores, daí a dificuldade que alguns têm de receber críticas. Por outro lado, um artista maduro sabe filtrar o que é simplesmente um ruído de comunicação de uma deficiência no conceito, o que é uma carência de experiência do leitor de problemas efetivos na construção da obra. Não em vão muitos escritores têm seus leitores beta, aqueles privilegiados que têm acesso aos textos em progresso. E o processo de escolher esses leitores também é muito delicado: confiar seus textos a alguém é um ato de exposição insuportável para alguns.

Em um artigo que li recentemente, outro aspecto foi levantado: o autor questionava o papel atual do editor na medida em que, muitas vezes por questões mercadológicas, exerce o que ele chama de “crítica prévia”, não dando aos leitores (nem à crítica) a possibilidade de ter acesso à obra tal como foi concebida. A discussão é interessante, pois implica considerar algumas facetas do editor, mas principalmente seu papel dentro do mercado editorial. Nesse sentido, talvez caiba diferenciar o editor de uma grande casa editorial de o profissional uma editora que não esteja necessariamente inserida numa lógica que vise, prioritariamente, as vendas.

O bom editor é aquele que se torna companheiro do autor na tentativa de trazer à luz o melhor que este pode conceber. Todas as leituras que antecedem à da obra editada são colocadas na mesa, não há como ignorar. Se houver confiança e seriedade, todos só têm a ganhar. Ou não?

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