A análise morfológica de nenhuma maneira pode prescindir do princípio da comutação, através do qual é possível desprender os elementos mínimos significativos, os morfemas, a partir da comparação de elementos permutáveis num vocábulo segmentado em conjuntos paradigmaticamente pertinentes (SILVA & KOCH, 1997). No entanto, valer-se unicamente da comutação pode gerar alguns equívocos, uma vez que um mesmo morfema pode assumir diversas realizações fonéticas. Cada uma destas configurações fonéticas denomina-se morfe, enquanto que o conjunto de morfes associados a um mesmo morfema são alomorfes (PETTER, 2003). Daí desprende-se o princípio da alomorfia, ou seja, a possibilade que cada forma mínima tem de variar seguindo certos critérios, sem prejuízo a seu significado.

A pesar de alguns gramáticos assumirem certas variações unicamente fonéticas como alomorfes (CUNHA & CINTRA, 1985), estas deveriam considerar-se alofones, segundo MATTOSO CÂMARA (1970). Enquanto os alofones se condicionam pelo contexto fonológico, como por exemplo a articulação de /e/ em [pedi], ou por variantes livres, muitas vezes associadas a realizações regionais ou diacrónicas ([pedi] em contraste com [pedji], os alomorfes se condicionam sob outros aspectos da língua, mas mantêm-se como unidades mínimas de significado. SILVA & KOCH, remitindo a MATTOSO CÂMARA, atribuem à alomorfia um condicionamento fonológico ou uma variação livre (morfologicamente livre para CÂMARA). Já para PETTER, este condicionamento se dá seja fonológica seja morfologicamente, teoria que parece mais aceitável, uma vez que transformações não sujeitas às regras fonéticas da língua não têm que necessariamente estar apartadas de regras.

Se por um lado SILVA & KOCH consideram o condicionamento fonético um processo morfofonêmico, PETTER adianta-se ao considerar o que alguns autores chamam de morfo(fo)nologia. De certa forma, tanto SILVA & KOCH como o próprio MATTOSO CÂMARA já consideravam a interrelação entre a morfologia e a fonética no princípio da alomorfia, uma vez que estas variadas realizações sempre estão associadas a um morfema, que encerra em si o significado.

De uma forma ou de outra, o pricípio da alomorfia é essencial a qualquer análise morfológica. Prescidir dele induziria a falsas interpretações de significado ou até a um exagero na sub-classificação de formas aparentemente diferentes, mas que efetivamente não passam de variações da mesma forma mínima, fenômeno bastante comum no processo de derivação vocabular, inclusive afetando os próprios morfemas lexicais.

REFERÊNCIAS

PETTER, Margarida. Morfologia. In: FIORIN, José Luiz (Org.). Introdução à Lingüística II: princípios de análise. 2. ed. São Paulo: Contexto, 2003

CÂMARA JR, M.. Estrutura da Língua Portuguesa. Petrópolis: Vozes, 1970. p. 25-27

SOUZA E SILVA, M. Cecilia.  KOCH, I. 1997. Linguística aplicada ao Português: Morfologia. São Paulo: Cortez, 1997. p. 20-22.

CUNHA, Celso. LINDLEY, Luis F. Nova gramática do português contemporâneo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. p. 76.

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